MEL | Project space in Porto | third event

 

Inauguração 22 de março

das 16h00 às 20h00

EARLYMADE CEDOFEITA

Rua do Rosário 235, 4050-524 Porto

 

MEL (um projeto colaborativo da Monitor, EARLYMADE Cedofeita e Lehmann) tem o prazer de apresentar, neste terceiro evento, uma seleção de obras de Diana Policarpo (Lisboa, Portugal, 1986) e Pedro Zhang (Évora, Portugal, 2001), a serem exibidas na Vitrine e Black Box da EARLYMADE Cedofeita.

 

VITRINE

Em 2020, Diana Policarpo desenvolveu a exposição “Nets of Hyphae”, com curadoria de Stefanie Hessler, numa coprodução entre a Galeria Municipal do Porto e a Kunsthall Trondheim. A exposição foi apresentada na Galeria Municipal do Porto entre 4 de dezembro de 2020 e 14 de fevereiro de 2021. Em “Nets of Hyphae”, Policarpo investiga as ligações históricas e especulativas entre as redes de fungos da cravagem (esporão-do-centeio), a saúde reprodutiva das mulheres e a supressão sistemática do conhecimento ancestral. O esporão-do-centeio, um parasita que infeta plantas de centeio, é responsável pelo ergotismo (conhecido como Fogo de Santo António) e foi historicamente utilizado por curandeiras para induzir abortos e tratar hemorragias pós-parto. No entanto, o capitalismo patriarcal deslocou este corpo de conhecimento, substituindo-o pela obstetrícia institucionalizada e marginalizando tanto a autonomia das mulheres como as práticas tradicionais de cura.

Para o MEL 3, serão apresentadas três impressões têxteis da série “Bodies We Care For”, de 2020 (impressões X, III e II).

O trabalho de Policarpo dá destaque a perspetivas feministas sobre psicadélicos, justiça reprodutiva e resistência. A artista traça paralelos entre as redes fúngicas e o saber de parteiras, curandeiras e camponesas, tecendo conexões entre sistemas históricos de opressão e esforços contemporâneos para recuperar direitos sexuais e reprodutivos. A sua prática desafia criticamente o controlo racializado e de género sobre os corpos das mulheres e a eliminação dos sistemas de conhecimento tradicional e comunitário.

Os três desenhos selecionados, exibidos quase como estandartes, podem ser interpretados como emblemas transportados para um campo de batalha simbólico—um onde a luta pelos direitos reprodutivos das mulheres, pela preservação do conhecimento comunitário e pelo acesso a substâncias que expandem a consciência é ativamente reivindicada. Ao mesmo tempo, esses estandartes podem ser vistos como erguidos junto a uma fogueira ou num forte comunal: sinalizando um espaço onde indivíduos que partilham valores e ideias comuns podem reunir-se, encontrar refúgio e descansar em paz. O trabalho de Diana Policarpo suscita constantemente estas respostas estratificadas—convidando-nos não apenas a entrar e a imergir no universo que constrói, mas também a internalizá-lo. A sua prática desperta em nós o desejo de acolher as questões que levanta, de as transportar connosco e, em última análise, de manter vivo o seu trabalho dentro de nós—sendo, de certo modo, tão alterador da mente quanto o próprio esporão-do-centeio.

 

 

BLACK BOX

Tal como as imagens não andam à procura de textos que as expliquem, também os tesouros não andam à procura de mapas. Se no vazio de um passeio, aproximando-nos lentamente, uma forma clara recortada ao longe contra o céu noturno da paisagem parecer sucessivamente um grande nariz a sair de um capote, uma estrela e um vulto dançante, isso deve-se mais às virtudes irrequietas do cérebro humano que tenta entender do que a passes de mágica operados pela matéria à nossa frente. E, no entanto, caminhando para lá enquanto os nossos passos fazem tremer um pouco a respiração e vice-versa, as mutações são mesmo visíveis.

As imagens usam os pintores para nascerem. Os títulos delas são placas indicando o nome ocial de uma vereda que ao lusco-fusco terá de ser entrada por cada um que vê e usando sobretudo de lanternas com dínamo de inquietação. Emboscando-o na sua própria imaginação, os espíritos usam o pintor para se mostrarem, para alfabetizarem um pouco mais o mundo humano acerca do íntimo dialeto “cosmicómico”.

Para se caçar gambuzinos ou introduzir outros à sua caça, é preciso já ter sido caçado por eles. E não são só eles que nos caçam. Para chegar a casa, apanhou o autocarro noturno. Com luzes baixas no interior, o grande ecrã de vidro da janela mostrou-lhe um enorme sobreiro girando lentamente sobre si mesmo no escuro de uma curva mais pronunciada. No exterior ventoso da casa que envolve a cabeça do pintor a dormir, saca-rabos, ginetas, nuvens retorcidas e botas isoladas presas na extensa poça de lama preparam-lhe a próxima armadilha.

 

Daniel V. Melim

 

 


 

Opening Saturday March 22nd

from 4 to 8 pm

EARLYMADE CEDOFEITA

Rua do Rosário 235, 4050-524 Porto

 

MEL (a collaborative project by Monitor, EARLYMADE Cedofeita, and Lehmann) is pleased to present its third event, a selection of works by Diana Policarpo (Lisbon, Portugal, 1986) and Pedro Zhang (Évora, Portugal, 2001).

 

VITRINE

n 2020, Diana Policarpo developed the exhibition “Nets of Hyphae”, curated by Stefanie Hessler, as a co-production between Galeria Municipal do Porto and Kunsthall Trondheim. The exhibition was presented at Galeria Municipal do Porto (December 4, 2020 – February 14, 2021). In “Nets of Hyphae”, Policarpo investigates the historical and speculative connections between the ergot fungus, women’s reproductive health, and the systematic suppression of ancestral knowledge. Ergot, a parasite infecting rye, is the cause of ergotism (commonly known as St. Anthony’s fire) and has historically been used by women healers for inducing abortions and managing postpartum care. However, patriarchal capitalism displaced this body of knowledge, replacing it with institutionalized obstetrics and marginalizing women’s autonomy alongside traditional healing practices.

For MEL 3, three textile prints from Policarpo’s 2020 series “Bodies We Care For” (prints X, III, and II) are presented.

Policarpo’s work foregrounds feminist perspectives on psychedelics, reproductive justice, and resistance. She draws parallels between fungal networks and the expertise of midwives, healers, and peasants, weaving connections between historical systems of oppression and contemporary efforts to reclaim sexual and reproductive rights. Her practice critically challenges the gendered and racialized control over women’s bodies and the erasure of traditional, communal knowledge systems.

The three selected drawings, displayed almost like banners, may be interpreted as emblems carried onto a symbolic battlefield—one where the struggle for women’s reproductive rights, the preservation of communal knowledge, and access to consciousness-expanding substances is actively reclaimed. At the same time, these banners can be seen as raised at a campfire or a communal fort: signaling a space where individuals who share common values and ideas can gather, find refuge, and rest peacefully. Diana Policarpo’s work consistently evokes such layered responses—inviting us not only to enter and immerse ourselves in the universe she constructs but also to internalize it. Her practice fosters in us a desire to embrace the questions she raises, to carry them forward, and, ultimately, to keep her work alive within us—being, in some sense, as mind-altering as the ergot fungus itself.

 

 

BLACK BOX

Just as images do not seek out texts to explain them, treasures do not look for maps. If, in the emptiness of a walk, as we approach slowly, a clear shape outlined in the distance against the night sky of the landscape, resembles a large nose emerging from a cloak, a star, and a dancing figure, this is more due to the restless virtues of the human brain trying to understand than to magical passes performed by the matter in front of us. And yet, walking towards it while our steps slightly shake our breath and vice versa, the mutations are indeed visible.

Images use painters to be born. Their titles are signs, indicating the official name of a path that, in the twilight, must be entered by each person who sees, mostly using lanterns with a dynamo of restlessness. Ambushing him in his own imagination, the spirits use the painter to show themselves, to educate the human world a little more about the intimate dialect of the ‘cosmicomic.’

To hunt snipes or to introduce others to their hunt, one must already have been hunted by them. And it’s not just them who hunt us. To get home, he took the night bus. With the lights dim inside, the large glass screen of the window showed him a huge cork oak slowly spinning on itself in the dark of a sharper curve. On the windy exterior of the house surrounding the painter’s sleeping head, meerkats, genets, twisted clouds, and isolated boots stuck in the large puddle of mud prepare the next trap to get him.

 

Daniel V. Melim